Maçonaria Anglo-Saxónica: Entre a Tradição e os Seus Próprios Dogmas
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A Maçonaria Anglo-Saxónica: “Dogmas” de uma Ordem que se diz livre?
A Maçonaria tem sido, desde o seu surgimento moderno em 1717, um tema envolto em mistério, controvérsia e fascínio.
Nascida com o ideal de liberdade de pensamento, num contexto iluminista, a instituição prometia romper com os dogmas religiosos e políticos da época. Contudo, ao olharmos com atenção para a chamada Maçonaria Anglo-Saxónica e os seus landmarks—as suas regras fundamentais—não podemos deixar de questionar até que ponto esta Ordem, que se autodenomina progressista, se mantém fiel aos ideais de liberdade e racionalidade que a fundaram.
Os landmarks, sistematizados e promovidos por figuras como Albert Mackey no século XIX, passaram a funcionar como pilares imutáveis.
Não é insignificante o facto de muitas Grandes Lojas norte-americanas, por exemplo, variarem amplamente no número e conteúdo destes princípios, indo de três a mais de cinquenta. Essa variabilidade evidencia a fragilidade da pretensa “universalidade” desses postulados.
A chamada "Grande Loja Unida de Inglaterra" (UGLE), referência maior da Maçonaria Anglo-Saxónica, procurou em 1929 consolidar essa doutrina em oito pontos.
Apesar da sua aparência concisa, estas orientações revelam contradições profundas.
Por exemplo, exige-se a crença num Ser Supremo e o juramento sobre um livro “sagrado”, reafirmando um substrato teísta e quase dogmático, num claro desvio do livre pensamento.
A imposição religiosa, ainda que disfarçada de ecumenismo, contradiz a suposta neutralidade espiritual da instituição.
Mais problemática ainda é a exclusão velada das mulheres.
Embora a formulação de 1929 não mencione abertamente esse veto, a UGLE continua a recusar o reconhecimento de organizações maçónicas que incluem mulheres ou promovem a igualdade de género.
Essa omissão deliberada é reveladora de um conservadorismo estrutural que entra em choque com a modernidade e a equidade, princípios que a Maçonaria alega defender.
Outro ponto que merece reflexão é a proibição de debates políticos e religiosos nas lojas.
À primeira vista, tal regra visa evitar divisões internas.
No entanto, a política e a religião são precisamente os campos onde a liberdade de pensamento mais se manifesta.
Silenciar tais discussões não será uma forma de censura auto-imposta que empobrece o espírito crítico?
A independência formal das Lojas e a exigência de não partilharem autoridade com outros corpos maçónicos, nomeadamente os que gerem graus superiores, também levanta suspeitas.
Trata-se de uma defesa da “pureza” ritual ou de um mecanismo de controlo interno?
A retórica da autonomia parece ocultar uma rigidez hierárquica típica de sistemas dogmáticos.
Em suma, os landmarks anglo-saxónicos, longe de serem princípios neutros e universais, são antes instrumentos de uniformização doutrinária que traem o espírito original da Maçonaria.
A sua rigidez, aliada à exclusividade de género e à imposição religiosa, transforma o que deveria ser uma escola de liberdade numa estrutura anacrónica, ciosa da sua autoridade, e desconfortavelmente próxima dos mesmos dogmas que se propôs superar.
A pergunta impõe-se: estará a Maçonaria Anglo-Saxónica preparada para uma verdadeira atualização ou permanecerá enclausurada nos seus próprios mitos fundacionais?
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