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Discurso de encerramento proferido em 27 de Setembro de 1996, por Fernando Teixeira, GM da GLRP

Discurso de encerramento proferido em 27 de Setembro de 1996, por Fernando Teixeira, Grão-Mestre da Grande Loja Regular de Portugal


Meus Irmãos:

Antes de mais quero agradecer-vos muito a vossa vinda Portugal.


A possibilidade de uma livre troca de ideias e o usufruto diário de um ambiente verdadeiramente fraterno e amigo, associados à elevação e ao interesse das várias intervenções, permitem-nos afirmar o completo êxito deste Encontro.


Quero no entanto apelar para a vossa tolerância e pedir-vos desculpa das muitas imperfeições que certamente se verificaram durante estes dias no nosso trabalho de anfitriões.


Notemos porém que a tarefa era complicada e que, ainda por cima não foi nada fácil aqui chegarmos.


Começo por citar as frases tristes e magoadas com que Mick Gayfer, Grão Mestre da Grande Loja da Austrália Ocidental, anunciou a sua desistência de organizar o Congresso Maçónico do Pacífico:

A Grande Loja da Austrália Ocidental ficou amargamente desapontada com o facto de fúteis politiquices terem levado as Grandes Lojas de Inglaterra, Escócia e Irlanda a declararem que não compareceriam no Congresso se nele estivessem presentes as Grandes Lojas da Itália, da índia, da Grécia e até do Estado de Washington (à data por causa da Maçonaria Prince Hall” … e prossegue “A grande Loja da Austrália Ocidental acha intolerável que estas políticas internacionais estejam impedindo o Congresso sem se preocuparem com a saúde e o bem estar da Maçonaria” (fim de citação)


Quando há mais de um ano me entusiasmei com a ideia de promover na Europa o Encontro Internacional de Grão-Mestres, interessou-me, devo dizê-lo e em primeiro lugar, saber se por esta forma obtinha ou não resposta a algumas perguntas angustiantes:

A Maçonaria actual é coerente com os princípios que defende? A Maçonaria é uma Ordem Universal, continental, ou está dividida em “lobbies” de interesses obscuros? Todas as Grandes Lojas Regulares têm os mesmos direitos? E os M∴ M∴ são todos iguais?


Quando dúvidas destas se põem poderemos dizer que estamos com certeza num caminho que entra em contradição violenta com quaisquer hipóteses de a Ordem Maçónica constituir um modelo moral e ético.


Com efeito, e como vêem, é perfeitamente possível notar aqui a ausência de quase todas as Maçonarias francófonas. Curiosamente (quase) todas começaram por aceitar entusiasticamente o nosso convite e todas terminaram a justificar a sua ausência com desculpas mal alinhavadas. Uma delas – facto muito notável – disse-nos que não vinha através de um fax enviado pelo aparelho instalado na sede da Grande Loja Nacional Francesa.


Primeira constatação: os Maçons são todos iguais, porém existem uns mais iguais que outros, ou seja, os Maçons são homens livres e de bons costumes excepto quando vivem em sistemas de neocolonialismo maçónico. Aliás, já o Grão-Mestre da Austrália Ocidental tinha tocado neste ponto não deixando dúvidas algumas a esse respeito. Cito as suas palavras (ver documento anexo): “Enquanto houver uma ameaça real e implícita de boicote por algumas Grandes Lojas que teriam como resultado a quebra de reconhecimento destas importantes Grandes Lojas Distritais Regionais este Congresso não pode prosseguir” (fim de citação). Subentenda-se, por parte das antigas potências coloniais.

Voltaremos ao tema.


Mas se continuarmos a analisar a coerência da realidade maçónica na Europa, verificamos a existência de muitas outras situações anómalas.


Por exemplo, quando um dos pontos da Regularidade diz que nenhum Corpo Ritual pode governar de forma alguma os três primeiros Graus, nem sobrepor-se à soberania das Grandes Lojas, existem Maçonarias na Europa cujos regulamentos consagram que só podem ser Veneráveis aqueles que tiverem o 12° Grau do seu Sistema de Altos Graus.

Trata-se das Maçonarias Escandinavas (Dinamarca, Noruega e Suécia), que infringem sossegadamente um dos mais importantes pontos da regularidade estabelecidos pela Grande Loja Unida de Inglaterra. Coincidência interessante, também estas Grandes Lojas, regularíssimas, já se vê, são avessas às reuniões de Grão-Mestres.

Conclusão: os Maçons são todos iguais, porem parece que há uns mais iguais do que outros.


Mas vamos adiante.


As Grandes Lojas são soberanas. Soberanas, entenda-se bem.


Em 1995, um Grão-Mestre de uma Grande Loja Europeia reatou relações com o Grande Oriente de Itália, relações que estavam suspensas havia cerca de ano e meio.


Um comunicado largamente difundido da Grande Loja Unida de Inglaterra ameaçou essa Grande Loja com a quebra do reconhecimento se não emendassem imediatamente o que haviam feito. Na semana seguinte a dita Grande Loja voltou a cortar relações com o Grande Oriente de Itália.


Conclusão: Todas as Grandes Lojas são soberanas, mas parece que há umas mais amestradas do que outras.


Nós próprios fomos fortemente pressionados para “excomungar” o Grande Oriente de Itália e juntarmo-nos ao “lobby” dos que reconheciam uma outra potência. Até porque o assunto não parecia transparente, resistimos, sofremos represálias mas continuámos sempre a considerar essas pressões totalmente inadmissíveis em Maçonaria. E mantivemos as nossas relações fraternas com a Itália, a Grécia e a índia. Fizemos bem. Afinal, parece que estas duas últimas Grandes Lojas vão voltar a ser “personae gratas” Os meus amigos Italianos que não desesperem. Como dizia Francesco Maria Piave. pela voz do Duque, “La donna é mobile / Qual piuma al vento”. O Duque em questão, bem entendido, é o do Rigoletto de Verdi, o Duque de Mântua.


Infelizmente. o problema não fica por aqui, e muito mais haveria que dizer.


Basicamente, alguma Maçonaria vem caindo no final do corrente século em comportamentos totalmente inadmissíveis que justificam uma progressiva hostilidade do mundo profano, aliás cada dia mais patente. Por vezes, como disse, chega a parecer que se formam “lobbies” de finalidade obscura. E essa será a fundamental causa da renúncia a um dos nossos maiores valores, o Universalismo. O que explica completamente a guerra contra as reuniões de Grão-Mestres.


Um dos problemas que carece de atenta observação, e que foge completamente ao verdadeiro espirito Maçónico, é aquele que já designei por Neocolonialismo. Quem se quiser aperceber da realidade deste fenómeno, bastar-lhe-á folhear os Yearbooks das outrora potências coloniais. Por exemplo, em antigas colónias ou noutros locais de influência de potências colonialistas, estas mantêm as seguintes Grandes Lojas Distritais: Bengala, Bombaim e índia do Norte, Burma, Malásia, Singapura, Hong Kong, Madrasta, Paquistão, Sri Lanka, Uganda, Quénia, Tanzânia, Gana, Namíbia, Natal, Nigéria, Estado , Gambia, Serra Leoa, Africa do Sul, Transval, Zâmbia, Zimbabwe, Antilhas, Bahamas, Barbados, várias Ilhas das Caraíbas, Guiana, Jamaica, Ilhas Caimão, Terra Nova, Trinidad, Nova Zelândia, América do Sul englobando Brasil, Uruguai, Chile e Argentina, e, na Europa, Chipre, Gibraltar e Grupo de Lojas de Portugal. Confessou-me o Grão-Mestre de um desses Distritos que já não sabia que havia de fazer para ser uma Grande Loja Nacional, pois embora o país seja independente há mais de trinta anos a sua Maçonaria continua totalmente sob o jugo da Loja -mãe.


Em certos casos, como já vimos, o processo de neocolonização é mais subtil. A Maçonaria é independentizada “de jure”, mas fica dependente “de facto”, o que é uma situação, diga-se de passagem, ideal para a implementação de canais negociais nos países em vias de desenvolvimento.


Não admira, pois, que desde o princípio este Encontro de Grão Mestres tenha sofrido violentos ataques com ameaças de quebra de reconhecimento àqueles que porventura tivessem a ousadia de aqui vir. Perante as respostas corajosas de algumas Grandes Lojas Americanas, designadamente as Grandes Lojas de Nova Iorque e de Illinois, os adversários do Encontro remeteram-se a um silêncio amuado. O respeito é uma coisa muito bonita.


Segundo parece, a França também terá desenvolvido consideráveis esforços, coisa que não estranhámos, porquanto as guerras tradicionais na Europa há muito nos ensinaram que a Inglaterra se bate sempre até ao último soldado francês.

Enfim, meus Irmãos, a situação actual da Maçonaria na Velha Europa é altamente preocupante. Felizmente ainda nos restam algumas Grandes Lojas dignas desse nome que, na sua maioria, aqui estão presentes. Bem hajam.


Mas por toda a parte, como vimos neste Encontro, os problemas são muitos e as soluções nem sempre são evidentes ou fáceis.


Porque chegámos nós a esta situação?


No último quartel do Séc. XIX, depois da declaração ateísta do Grande Oriente de França, deu-se a divisão da Maçonaria em Regular e Irregular.


E porque estas últimas representavam com o seu o seu anticlericalismo e o seu intervencionismo político-partidário uma clara deformação do verdadeiro espírito maçónico, logo as Maçonarias ditas Regulares empreenderam, e muito bem, uma cuidada purificação das suas hostes. Infelizmente, e como muitas vezes sucede no desenvolvimento de grupos humanos activos, alguns resolveram tomar conta do poder instaurando uma verdadeira caça às bruxas, que só não foi mais longe, devido à maturidade, à força e à inteligência da Maçonaria Norte Americana. Os últimos tempos, com as perseguições já referidas à Grande Loja da Grécia e ao Grande Oriente de Itália, demonstram amplamente o que aqui deixo dito.


Por outro lado, porque era absolutamente essencial não fazer política, tinha de se fazer qualquer coisa, e porque não se sabia fazer mais nada, fazia-se Ritualismo e Jantarismo. É certo que também havia acções de caridade. Mas a progressiva integração dos serviços de solidariedade social nos aparelhos do Estado veio a minimizar essas acções em muitos países europeus.


Daí para a frente, terá começado o envelhecimento da Ordem Maçónica a qual todos temos vindo a assistir.


Meus Irmãos, o Séc. XXI não vai suportar uma Organização com estas características. Urge rapidamente estudar soluções e adequar os meios para correspondermos, como muito bem sintetiza Dean Roscoe Pound, ao mais nobre dos objectivos maçónicos: preservar, desenvolver e transmitir à posteridade os princípios civilizacionais que os nossos maiores nos ensinaram


Por isso entendemos que as reuniões de Grão-Mestres a nível Universal são cada vez mais necessárias para um correcto cumprimento dos nossos deveres. E que Deus nos auxilie neste difícil trabalho e nos dê a sua generosa bênção.


Fernando Teixeira – Grão-Mestre da Grande Loja Regular de Portugal


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