Os Condados da «Reconquista» no Norte | PORTUGAL
Os Muçulmanos desembarcaram na Espanha, com objectivos de conquista, em 711. Dois anos mais tarde, praticamente toda a Península se achava subjugada ao Islam.
A Lusitania e a Gallaecia caíram em 713 também.
A «Reconquista» cristã começou só nos meados do século viii, partindo, não de um reduto indómito no Norte, mas antes de uma rebelião fortalecida por várias migrações de nobres e de soldados para o norte. Como tantas outras campanhas militares na história, a «Reconquista» saltou de um pedacinho de território nas Astúrias 44 para uma vasta região limitada a sul pela bacia do Douro. Parece que uma revolta de Berberes deixara desarmados bom número de cidades e de castelos. Isto explica, em grande parte, as vitórias do rei Afonso I, que na verdade abrangeram toda a Gallaecia (à qual, daqui em diante, passaremos a chamar Galiza, com cheiro mais vernáculo) e alcançaram a Lusitania até Veseo (Viseu).
Os Muçulmanos responderam com várias campanhas devastadoras, principalmente as de 764, 791, 794 e 840.
Durante mais de um século, a maior parte da Galiza converteu-se, se não num campo de batalha, pelo menos numa zona de fronteira muito pouco segura, assaz desorganizada, com cidades meio desertas e meio queimadas, empobrecida e escassamente povoada, com todos os seus bispos (isto é, a maior parte das suas autoridades) em fuga para junto do rei onde gravitariam por longo tempo. O sul da Galiza, entre os rios Mínho e Douro, sofreu muito particularmente com uma tal situação. Foi só pelos meados do século ix que as condições melhoraram e se julgaram favoráveis bastante para uma reorganização - e um repovoamento generalizados.
Duas antigas cidades, uma no Sul, Portucale, a outra no Norte, Chaves (a Flaviae romana), tornaram-se importantes centros administrativos de onde irradiou a maioria desses esforços. Aí se estabeleceram condes nomeados pelo rei para dirigir as tarefas do povoamento. Vimara ou Vimarano Pérez, a quem o rei Afonso III confiou o governo de Portucale, não deve ser esquecido em qualquer descrição histórica das origens de Portugal. Pelos fins do século, a região deixara de ser considerada fronteira. Este era agora o caso das áreas a sul do Douro, onde as hostes cristãs se afadigavam na conquista de importantes cidades como Coimbra (a antiga Conimbriga ou Colimbria, a QuIumriyya árabe) em 878, Viseu, Lamego (a antiga Lamecum) e Idanha (a Egitania romana, a Antaniyya árabe).
A sua reorganização começou pouco depois, pelo menos até ao rio Mondego. Pelos finais do século ix, todos os bispos a sul do Minho estavam de volta às suas dioceses, com excepção dos de Braga e Idanha. O optimismo cristão revelava-se, todavia, prematuro. Os Muçulmanos voltaram, e com eles novas destruições e nova desorganização. Ataques esporádicos e correrias para cá e para lá - numa delas, o rei Ordonho III atacou Lisboa em 955 - foram seguidos por uma campanha sistemática nos fins do século x: al-Mansur voltou a colocar a fronteira permanente no Douro, embora tivesse devastado toda a Galiza com seus ataques vitoriosos. Precisaram os cristãos de setenta anos mais para tornarem ao Mondego. Só em 1057 foi Lamego definitivamente reconquistada, depois Viseu (1058) e a seguir Coimbra (1063 ou 1064). Para avaliar das desastrosas condições de todo esse território, basta ter em conta as datas em que os bispados se restauraram: 1070-Braga; 1080-Coimbra; 1114- Portucale; meados do século xii - Lamego e Viseu. Dume (a antiga Dumio) nunca foi restaurada, sendo absorvida por Braga.
A Idanha transferíu-se para a Guarda, mas só em 1199 é que foi para lá nomeado um novo bispo. Dentro do reino das Astúrias (ou de Leão como passou a ser conhecido depois do século x), as grandes unidades para fins administrativos eram Astúrias propriamente dita, Leão, Galiza e Castela. Eram as chamadas terrae, às vezes também provinciae, e o seu governo confiava-se a um conde (comes), igualmente chamado duque (dux). Contínuava-se, portanto, e reforçava-se a antiga tradição romana e visigoda. Havia, é claro, muitos outros condes (comites) que administravam unidades mais pequenas, também chamadas terrae ou territoria. É este duplo sentido, um lato e um restrito, de ambas as palavras terra e comes, que confunde frequentes vezes a análise histórica.
Dux e provincia aplicavam-se sempre ao governador da unidade maior e à unidade maior em si. De tempos a tempos, testamentos régios e discórdias internas tornavam a Galiza «independente». Aconteceu isso com Ordonho II, de 910 a 914, que foi rei da Galiza antes de ser rei de todo Leão.
Aconteceu outra vez com Sancho Ordõilez, seu filho, de 926 a 929, e novamente com Ordonho IV, em 958-961. De 926 a 930, a Galiza foi ainda desmembrada em duas partes, dando-se o sul a Ramiro Ordóflez, que foi assim «rei de Portugal» antes de herdar a totalidade dos domínios de seu pai, como 47 Ramiro II (930-950). A última decisão real que concedeu à Galiza individualidade política teve lugar em 1065 quando, por morte de Fernando I, o país foi dado a um dos seus filhos, Garcia. Governou de 1065 a 1071. Estes curtos períodos de separação nada significavam. Eram coisa normal na maioria dos estados feudais e geralmente não implicavam quaisquer fins permanentes de autonomia. Nem sequer resultavam de esforços locais visando a independência.